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2- O Quanar


Há duas razões para eu escrever esse capítulo. A primeira é que, apesar de todos consumirem o Quanar, nem todas as pessoas e raças conhecem sua história. A segunda razão é que, por ser o elemento mais precioso do mundo e o centro de todas as sociedades é impossível descrever Illirian sem antes discorrer sobre o Quanar.

A palavra Quanar é derivada da língua élfica, Quaranenafath, que significa “o quarto elemento”. Assim como o ar, a água e os alimentos, o Quanar é essencial para a vida. O Quanar é um mineral que, quando extraído e purificado por um processo alquímico, torna-se o famoso elixir que todos nós consumimos. O elixir deve ser consumido, em média, uma vez a cada 6 meses. Alguém que não consuma sua dose de Quanar passa por crises de abstinência e, ao final do processo, sofre a irreversível mutação.

Abstinência e Mutação

A mutação talvez seja o destino mais temível em nosso mundo. As pessoas que não consomem o Quanar tornam-se bestas violentas. Cada raça possui uma mutação característica e, até hoje, irreversível. A besta ataca violentamente qualquer ser em seu campo de visão. Em meus tempos de aventura com a Comitiva Traidora nós combatemos diversas dessas criaturas. Elas atacavam sem piedade e continuavam lutando mesmo quando perdiam membros de seus corpos. As bestas se reconheciam e não se atacavam, muito pelo contrário, quando uma besta encontrava outra elas começavam a andar juntas. Sei disso porque chegamos a combater dez dessas criaturas de uma única vez.

De alguma forma, que ninguém ainda conseguiu explicar, as bestas não precisam de alimento, água ou ar. Alguns clérigos sustentam a teoria de que essas pessoas tornam-se mortos vivos, semelhantes aos produzidos através da necromancia. Porém nem mesmo os mais poderosos clérigos conseguiram expulsar as bestas com os seus poderes divinos, o que pra mim já é prova suficiente que esses seres não fazem parte do mundo dos mortos. As bestas simplesmente vagam de um lugar para outro e destroem o que puderem alcançar.

Cada região e cultura tem sua própria forma de lidar com as pessoas que chegam a esse estado. Na maioria dos lugares civilizados, os elixires são subsidiados pelos governos, logo raramente alguém chega ao estado bestial da abstinência. Em regiões menos caridosas, essas pessoas são isoladas em regiões específicas ou simplesmente mortas pela guarda local. Há regiões dominadas por essas criaturas, como as ruínas de Andra Tur e o Vale dos Uivos. O porquê dessas criaturas se aglomerarem nessas regiões ainda não foi explicado e diversos grupos de aventureiros já perderam suas vidas tentando explora-los.

Fontes

Há três fontes conhecidas de Quanar. A fonte mais comum é a mineral, que todos conhecem. O Quanar bruto é extraído das minas e refinado através de um processo meticuloso e secreto que, somente nós, alquimistas imperiais, sabemos.

A segunda fonte conhecida de Quanar é a seiva de certas plantas. Essas plantas extraem a essência mineral da terra através de suas raízes. Com a seiva dessas plantas é possível se produzir um elixir semelhante ao que os Alquimistas fazem. Esse processo é conhecido e guardado pelos Rajarianos, raça que se tornou mestre nessa arte. Alguns poucos elfos, de confiança dos Rajarianos, aprenderam o processo e o utilizam no Reino de Enfalenri.

A terceira fonte de Quanar é a fonte amaldiçoada: o sangue daqueles que consomem os elixires. Essa prática é abominada em Illirian, os Banidos são a grande prova que a morte é preferível a esse ato de barbárie.

Vocês conseguem enxergar um padrão aqui? Beber o sangue de alguém é proibido, extraí-lo das plantas é um segredo que poucos sabem e refiná-lo através da alquimia é um processo guardado pelos alquimistas imperiais. Como então alguém consegue obter o Quanar? Ouro é lógico. Um trabalhador deve economizar para garantir sua porção de Quanar e a de sua família. Por ser muitas vezes subsidiado pelos reinos, isso normalmente não era um problema. A grande questão é que as fontes de Quanar estão se esgotando. Extraímos o quarto elemento há centenas de anos e sabemos que ele não é uma fonte renovável. O que ocorre muitas vezes é que a demanda supera a oferta e, mesmo que você tenha muito dinheiro, é possível que você não encontre o Quanar no mercado. Guerras e batalhas já foram travadas por esse motivo e parece que ninguém ainda encontrou uma solução para o problema. Há diversos aventureiros que se arriscam na Fronteira ou na Terra dos Amon Ruh em busca de uma nova fonte do precioso mineral, mas são poucos os que conseguem encontrar algo.

Hoje, grande parte das minas de Quanar é propriedade do Império Akroniano, que também é o governante dos alquimistas imperiais. Resumindo, o Império conseguiu criar um monopólio de um elemento que é essencial à vida. “Quem controla o Quanar, controla Illirian” essa é uma frase do próprio imperador. Controlando a distribuição e o preço dos elixires, Akron consegue manipular todos os demais reinos e expandir continuamente suas fronteiras.

História

Porém como tudo isso começou? Como as pessoas souberam que precisavam do Quanar para sobreviver?

Não há propriamente uma história sobre o Quanar, o que existem são diversas teorias que tentam explicar como as raças vieram a descobrir que necessitavam desse elemento. Como alquimista imperial eu estudei todos os livros que já foram produzidos sobre o Quanar. Em minha opinião, a teoria mais lógica é a do historiador anão Dundorar, que viveu nos tempos em que Undarak ainda era rei em Thorondor.

Dundorar estudou diversas comunidades que utilizam o Quanar e concluiu algumas coisas interessantes. Ele estimou que, há muitos de anos atrás, o mineral era extremamente abundante em nosso mundo. A água e o solo eram extremamente ricos nessa substância. As raças o consumiam sem mesmo saber que ele existia. Mas o Quanar não precisa ser destilado? Eu me fiz a mesma pergunta nos tempos de estudante. Dundorar concluiu que o Quanar era mais puro nessa época e dispensava o processo de destilação. Convenhamos que é uma excelente teoria. Ela explicaria como as raças conseguiam sobreviver sem o refino do Quanar.

Dundorar continua sua teoria nos pedindo para imaginar que as civilizações continuam crescendo e se expandindo. O que aconteceria com o Quanar? Escassez. Ele foi se esgotando aos poucos e, em pouco tempo, muitas pessoas começaram a se sentir mal por causa da abstinência. Nesse tempo devem ter surgido diversas batalhas para combater as criaturas geradas pela mutação. Reinos devem ter sucumbido com os ataques e civilizações inteiras podem ter sido consumidas pela maldição. A teoria nos diz que algum sábio ou grupo de estudo conseguiu descobrir o que estava acontecendo e desenvolveu a primeira versão do elixir. Eles sobreviveram e o conhecimento foi passado de geração em geração.

Dundorar nunca ganhou muitos adeptos a sua teoria, as pessoas preferem acreditar que a escassez foi a maldição de um deus qualquer e que outro deus qualquer ensinou as raças o segredo dos elixires. Eu particularmente acredito que o anão era genial. Nunca li ou ouvi outra teoria que fosse mais sensata ou lógica.

Consumo por outras criaturas

Uma dúvida comum é se todas as criaturas viventes precisam de Quanar. Afinal não vemos vacas, cavalos, passarinhos ou carvalhos consumindo os elixires. Animais e plantas raramente sofrem mutação, o que nos leva a concluir que seus corpos sobrevivem com o pouco Quanar que eles absorvem em sua cadeia alimentar. O que reforça ainda mais a teoria de Dundorar de que há resíduos de Quanar no solo e na água.

O processo de consumo de Quanar por outras criaturas como trolls e dragões ainda é desconhecido. A teoria mais aceita é que, eles recebem sua fonte de Quanar através das criaturas que esses seres consomem e que essa quantidade basta para evitar que eles sofram a mutação.

Usos

O Quanar possui outros usos além de prevenir as mutações.

Equipamentos

Os melhores ferreiros de Illirian utilizam Quanar para produzir armas e armaduras. Esses equipamentos possuem propriedades magníficas e costumam custar uma pequena fortuna. Isso é possível graças à propriedade intrínseca do Quanar de formar ligas metálicas. Os ferreiros costumam misturar pequenas quantidades do Quanar em suas ligas o que resulta em uma liga extremamente resistente e maleável. Somente os mais abastados conseguem comprar uma dessas obras primas, porém alguns aventureiros sortudos conseguem encontrar esses equipamentos em tesouros perdidos em templos abandonados e esquecidos. Elden, meu amigo e nosso ladino da Comitiva Traidora, possuía um sabre forjado com a liga de Quanar. A espada era extramente leve e possuía um corte mortal. Elden adorava mostrar o sabre a todos e sempre contava uma história diferente de como ele o obteve. Bons tempos aqueles...

Há uma série de outros pequenos utensílios que costumam utilizar o Quanar em sua liga. Os artesãos que trabalham com vidro costumam ter um estilete com a ponta de Quanar para cortar as peças mais delicadas. Curadores utilizam o mesmo estilete nas cirurgias.

Ganchos, polias e roldanas, peças essenciais em construções, podem ser reforçados com o Quanar. Esses equipamentos conseguem suportar até 3 vezes mais peso quando a liga é utilizada.

Adubo e Alimentação de Animais

O pó de Quanar pode ser misturado ao solo e utilizado como adubo. Quando assim feito, as colheitas costumam produzir três vezes mais. As plantas aumentam a sua resistência à pragas e a temperatura.

O mesmo pó pode ser misturado à ração animal. Os animais tornam-se mais fortes, velozes e resistentes. Os cavalos de raça do Imperador são criados com esse tipo de ração e não há nenhum outro animal que consiga igualar sua velocidade.

Ambas as práticas são pouco utilizadas em Illirian. A primeira razão é o preço. A população comum precisa economizar para comprar a quantidade necessária para sua sobrevivência e não sobram recursos para gastar com animais e plantas.

A segunda razão é que, tirando o Império que é uma exceção, o Quanar é um elemento escasso nos reinos. Há épocas em que você simplesmente não consegue encontrar o mineral e os elixires.

A terceira razão é que tanto os animais como as plantas tornam-se dependentes. Se não forem alimentados constantemente com suas porções de Quanar eles sofrerão a mutação.

Habilidades Sobrenaturais

Um ser comum costuma consumir o Quanar uma vez a cada 6 meses. A frequência de consumo pode ser alterada e isso traz diversos benefícios e uma desvantagem.

Alguém que consuma o elixir a cada 3 meses torna-se mais forte e inteligente do que os outros membros de sua raça. Ele vive mais e torna-se imune a doenças normais. Grande parte dos aventureiros se enquadra nessa categoria. Por viverem constantemente em perigo, o aumento na frequência de consumo é quase inevitável.

Uma pessoa que utilize o Quanar mensalmente começa a apresentar poderes sobrenaturais como super força, uma destreza inacreditável, leitura de mentes, regeneração, invisibilidade entre outros. Os efeitos são imprevisíveis e costumam se manifestar de formas diferentes em cada indivíduo. Há raríssimas pessoas que estão nessa categoria. Uma delas é Zeik, o mestre guardião do Templo da Luz. Zeik, através de seu treinamento e do consumo do Quanar, desenvolveu uma habilidade de desmaterializar o seu corpo. Até hoje ninguém conseguiu derrotar Zeik em um combate singular. Quando um oponente tenta golpeá-lo ele simplesmente se desmaterializa. Zeik consegue sustentar o seu consumo pelas diversas doações que recebe dos peregrinos e desafiantes que visitam o templo.

Só há um usário semanal do Quanar. Ele é o próprio Imperador Akron. Akron controla grande parte das fontes de Quanar de Illirian, então ele não possui muita dificuldade em sustentar o seu consumo. Akron é um humano com mais de 500 anos de vida e ninguém sabe ao certo a extensão dos seus poderes.

Não há relatos de alguém que consuma o Quanar diariamente.

Apesar de todos esses benefícios, aumentar a frequência de Quanar é extremamente perigoso. Se o elixir não for bem feito ou a dose for muita alta, a quantidade excessiva do mineral pode matar seu usuário. Por esse motivo, o aumento de frequência costuma ocorrer de forma gradual e vagarosa. Se o corpo do usuário conseguir sobreviver a uma frequência maior de Quanar o mesmo nunca mais conseguirá voltar para a frequência anterior. Logo, se você passou a consumir o Quanar mensalmente, você deverá manter essa frequência, caso o contrário sofrerá a mutação. Mutações de usuários assíduos de Quanar costumam ser mais poderosas que de usuários normais. Os bardos possuem uma brincadeira musical onde eles tentam adivinhar o que acontecerá se o Imperador sofrer uma mutação. A música é apenas uma brincadeira mas, com as fontes cada vez mais escassas do Quanar, ela traz uma questão perturbadora.


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